PRINCÍPIO DE UM LIVRO POR FAZER
- E apanhavas muitos pássaros com as armadilhas? - Muitos. Mesmo muitos. Melros, tentilhões, rouxinóis, até pardais. Os pardais eram os mais difíceis de apanhar. Muito espertos. Duvidavam de tudo. Até do bicho parado que ali estava tão fácil de comer. Preferiam os bichos vivos que tentavam fugir para os buracos. - E não sentias remorsos? - Sinto-os agora. Muitos. Por agora e pelos que não senti então. -Por que não sentias remorsos matando pássaros tão pequenos, tão livres e tão lindos? - Porque adorava comê-los. Então, eu, o Natalino ou o Zé Pataco compartilhava-mos os pássaros que os nossos costelos tinham apanhado. Depenávamo-los, estripávamo-los, lavávamo-los e púnhamo-los a fritar. Púnhamos-lhe colorau para ficarem mais saborosos e mais bonitos. Era uma comunhão feliz com pássaros rosados que devorávamos com as nossas mãos besuntadas de gordura. As hóstias brancas que comíamos na igreja com solenidade triste, dadas pelas mãos limpas do padre Manuel, engolíamo-las ...