PRINCÍPIO DE UM LIVRO POR FAZER
- Já se foram os tempos de glória. Agora sou só um doutor de merda.
- No último dia de cada mês acordava às seis da madrugada. Todos os meus camaradas dormiam ainda no Palácio da Loucura. Em silêncio ia para a cozinha, fazia uma caneca de café, saboreava-o como quem saboreia o tempo. Limpava os lábios a um rolo de papel higiénico pendurado num arame sobre a mesa da cozinha e dirigia-me depois para a casa de banho. Molhava a cara com água bem quente, espremia o creme de barbear sobre o pincel previamente molhado com água bem quente, esfregava-o na cara fazendo uma espuma abundante. Escanhoava-me cuidadosamente pois aquele dia era sempre um dia solene na minha vida. A loção que colocava depois da barba tinha um perfume suave que dava serenidade ao meu amanhecer. A sanita era o momento seguinte que me fazia sentir purificado junto de divina Penélope. Vestia o meu único fato que mantinha para os momentos marcantes da minha vida. Colocava uma gravata sanguínea e saia, calmamente, pela porta verde do Palácio. Voltava à direita naquela rua que, talvez profeticamente, se chamava Antero de Quental e, depois, novamente à direita descendo a Rua Tenente Valadim. Já na Avenida Sá da Bandeira esperava-me a divina Penélope no Pigalle .
- Introibo ad altare deae.
- Ascendes ad altare per grades.
- Meu primeiro irmão pretendente, Eurímaco, a que horas começa o banquete no Pigalle?
- Às sete em ponto, Venerável Antínoo.
- Que horas são meu segundo irmão pretendente Liócrito?
- São sete horas em ponto Venerável Antínoo.
- Sendo sete horas em ponto, ao terceiro murro na mesa declaro iniciado o banquete.
-Puuum. Puuum. Puuum.
-Saia um barril de Topázio para a mesa do Venerável Antínoo.
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