CAMINHO SOBRE AS FERIDAS DE OUTONO

Caminho sobre as feridas de Outono

Sou um faquir saboreando espadas

E cuspindo labaredas contra

O negro do céu.


E tudo parece em vão

E não foi.


Tudo parece vento contra

As colunas 

E os capitéis decepados

Que o vento gosta de escarnecer.


Nada lhe resiste

Ao ar flagelando o mar

Nem ao sentimento do tempo.


Fúrias fundas

Fogos fátuos

Flácidas flores de Outono

Que caem como cascatas

Sobre a liberdade tantas vezes esmagada


Não ouvi o amor

Que ria à sombra das raparigas

Sobre o orvalho do Verão

Não bebi as luminosas águas fendidas

Ao fundo´

Onde nadavam peixes nus

À semelhança de príncipes.


Apagam-se agora os espelhos

Da Primavera

Vai-se fechando a janela do peito

À alegria

Vai me retirando à vida 

Um Deus castrado.


E tenho vontade de dormir

Dormir dentro duma ânfora

Sonhando com a estrada perdida

Que nunca mais voltará.


HENRIQUE DÓRIA






 

Comentários

  1. Belo e angustiado poema, Henrique. Desejava que essa beleza toda se dourasse de alegria.

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