NLD
Diluo-me nas personagens dos livros que li mais do que nos seus autores. E na mesma obra sou várias personagens, muitas vezes contraditórias, porque em todos os modos de ser há uma razão para ser isso, uma razão que os próprios seres quase sempre ignoram, ou muitas razões ou, até, nenhuma razão mas apenas um acaso, ou razões e acasos que tantas vezes são a mesma coisa.
Nunca me imaginei a ser advogado, eu advogado usando para sobreviver as regras que regem as vidas sensatas, fazendo-o com displicente dedicação ou agressiva e ridícula paixão. E, no entanto, sou-o fazendo de mim personagem inesperada da minha própria vida, uma personagem que escreve e ao escrever se nega. Diria que a minha vida concreta é o contrário da vida dos escritores, para quem a abstração é a vida concreta, pois, em mim, a vida concreta tomou conta da abstração que é o meu mundo, desafiando constantemente a realidade em que me encontro mergulhado sem saída.
Há, porém, algo de comum entre advogados e escritores: ambos convivem bem com a mentira, mas com a diferença de que, no escritor, a sua mentira é a sua verdade e, no advogado, a mentira dos outros é a sua verdade.
Ser advogado é ter a juíza Loureiro como mestre e árbitro do jogo da verdade e da mentira, e o advogado Viegas como adversário nesse jogo. Entre a mentira do advogado Viegas e a verdade da juíza Loureiro, estou eu e, de vez em quando, o procurador Saraiva.
...
Comentários
Enviar um comentário