O NOVO LIVRO DO DESASSOSSEGO

 Sinto saudades da infância, não da que tive mas da que imagino que tive. Pensar o passado esquecido, rever o que se perdeu de vista, sentir felicidade onde ela não houve e alegria mesmo que a noite fechada no meu quarto não me permitisse ir ao baile e, se fosse, nenhuma mulher bonita aceitaria dançar comigo, não porque eu fosse feio mas porque tinha excesso de imaginação que é o contrário da ação e, para a mulher, o homem da sua imaginação é o homem de ação, e tudo isso não é mais do que a melancolia do que sou envolvendo o vazio de vida do que fui.

Há um saxofone na minha vida que me deixa triste e feliz. Triste porque não fui aquele baile, feliz porque ouvi o saxofone, e ninguém de tantos que estiveram no baile o ouviu como eu. Havia luzes de querosene, e risos, e palmas, sussurros de ternura que escondiam o som do saxofone que eu tão bem escutava, porque na noite fechada os meus ouvidos abriam-se e eram do tamanho do mundo.



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