DIÁLOGO IMAGINÁRIO

 Francisco de Assis

- Todo o saber do homem é vão e todo o seu poder uma torre arruinada, Frederico. De que te serve o teu saber contra a morte? Acaso matarás um dia a ceifeira do tempo? Acaso lhe poderás dizer , numa das nove línguas que te orgulhas de falar: vai-te, quando ela se aproximar? Ela  compreender-te-á numa dessas nove línguas, ou precisarias de novecentas e noventa e nove para ela te entender. E, ainda que as soubesses, isso seria suficiente face à sua eterna mudez? Falando à morte apenas enches a boca do vento do teu orgulho. Existes antes das estrelas ou das montanhas para conheceres a sua criação? Sabes o que se encontra dentro das sementes para que elas rompam a terra, cresçam e te deem pão? Conheces a sabedoria íntima do sol quando te aquece ou a indiferença do gelo quando se abate o inverno? Compreendes a luz do dia ou as trevas da noite?

O teu poder não passa de cinza dentro duma urna de pórfiro. Sais com a espada e o escudo a enfrentar os teus inimigos. Contra ti eles não escaparão à morte ou à humilhação. Cegarás os seus olhos e cortarás os seus narizes, deceparás as suas mãos e os seus pés. Deixarás as suas cidades desoladas e os seus campos devastados pra que não lhes deem pão, as vinhas e as oliveiras queimadas para que não lhe deem frutos. Mas hordas e hordas surgirão com os tempos.

Sempre, todos os impérios foram destruídos pela espada e pelo fogo. O teu império não escapará. O teu orgulho será abatido. Não te enganes a ti mesmo.

Frederico II da Suábia

-Apenas tento compreender Francisco. Se escrevo ao sultão  de Egito ou leio as suas cartas sábias convidando à paz e à aceitação das nossas diferenças, propondo o simultâneo rebater dos sinos com o convite dos muezins à oração, é para que  as ruas das cidades não se tinjam com o sangue dos homens.  Há um só Deus. Os seguidores de Cristo dão-lhe um nome, os infiéis outro. Mas eles O veneram com o mesmo fervor com que nós adoramos o Criador, o Todo-Poderoso que está por detrás desses nomes. Construí esse castelo no alto da tua cidade para que a não destruam os orgulhosos e os sôfregos de poder e de riquezas. Sem ele, os desventurados seriam esmagados como as ervas sob as patas dos cavalos. Sou imperador para defender os humildes da arrogância dos poderosos. Os meus inimigos erguem a espada para me degolarem, abrem a boca para me devorarem. Mas o meu poder foi-me concedido por Deus para travar as suas iniquidades. A coroa imperial foi colocada na minha cabeça pelo Seu representante na terra para que eles não exerçam a sua violência sobre os mais fracos, e não os sufoquem com o manto da sua maldade.




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